O kitsch pop cult paraense e as personas na pesquisa em mídias sociais

As novas roupagens para referências musicais e culturais vistas como “bregas”, transmutadas em kitsch e cult, ganharam considerável e oportuno destaque nos últimos 10 anos no Brasil. Um exemplo desta safra é o cantor e compositor Felipe Cordeiro, de Belém do Pará,  “Kitsch Pop Cult” (2012) e “Se Apaixone Pela Loucura do seu Amor” (2013). A estética hiperbólica, exagerada e passional do gênero direcionou a beleza da música e clipe “Legal e Ilegal”, lançada em 2012, uma verdadeira aula de construção de personas.


Dirigido por Brunno Regis e Carolina Matos, o clipe traduziu magistralmente a letra. Inspirada tematicamente por uma declaração do João Gordo e melodicamente por Karnak, “Legal e Ilegal” fala das drogas no mundo da música, fazendo pares entre substâncias e estilos/nichos.

Aguardente no bom samba canção
Uisquinho da bossa nova
Caspa do diabo no rock’n’roll
Erva do amor no reggae night.

Cultura sintética no drum’n’bass
(rosinha, branquinha, pílula amarela)
Cuba libre na salsa peruana
Flocos de milho com cerveja no velho punk
Lança perfume no carnaval.

A gengibirra no marabaixo
Muito tabaco no bolero (essa eu não tolero, essa eu não tolero)
Um vinhozinho ou chocolate quente (no tango é bom)
A tequila no merengue (é dessa que eu gosto, é dessa que eu gosto)

Grupos culturais, especialmente ligados a nichos musicais, compartilham de todo um arsenal de referências em comum, que vão muito além da música em si. Vestuário, léxico, gírias, locais, inclinações políticas, atitudes sociais são algumas das variáveis identitárias em jogo. O consumo de certas drogas também tem considerável correlação, seja pela ligação estreita com a filosofia do gênero, seja por efeitos propícios ao tipo de fruição ou uma combinação de vários fatores.

legal e ilegal - personas - música e drogas

Para quem busca compreender o público nas mídias sociais, especialmente para construir personas, ter sempre em mente as referências, valores e atividades que definem o público quem ele é torna-se um aprendizado essencial. A construção identitária de um grupo vai muito além de sua atividade núcleo. E, mais ainda, vai além do que você está observando. Seu consumidor não é o que ele faz com sua marca ou produto. A rigor, nem deve ser visto apenas como consumidor, pois este termo pressupõe a relação pessoa-produto como prioritária, mas como indivíduo, com suas várias dimensões, atividades, interesses e opiniões.

personas - caspa do diabo - legal e ilegal

“estereótipo” e “clichê” possuem papéis tanto no caso da dinamicidade do clipe Legal e Ilegal quanto na simplicidade de um bom relatório de público e personas. Os pares droga-gênero no clipe não são determinantes ou presentes em todos os indivíduos que se identificam com as respectivas culturas. Mas estão presentes no imaginário e nas expectativas sobre cada um dos nichos e são frequentes (absoluta ou relativamente a outros). Com responsabilidade, é possível apelar para atalhos referenciais com alta carga semântica.

cuba libre salsa peruana

O apuro cenográfico, minimalista, faz lembrar da importância das referências visuais e artísticas na construção de um público.  Quando falamos de mídias sociais, as minúcias nos perfis do público são grande fonte deste tipo de informação, especialmente em um momento de suma importância de Instagram e Snapchat. Além de poses e gestos, as fotografias e selfies são indicadores também do com o quê cada pessoa e grupo decide e se permite fotografar e enquadrar.

legal e ilegal - reações

Em parte das viradas de câmera, o clipe faz a ponte entre gestos e olhares realizados entre os grupos representados. Implicitamente lembra que a definição de uma comunidade é composta também de sua alteridade: também sou aquilo que não sou. No contexto da representação online dos indivíduos através das mídias sociais, atitudes de conflito e agressividade muitas vezes são motivadas não só por ódio, mas por posicionamento. Representatividade, espelhamento ou rejeição ao outro constrói o eu.

O kitsch é a estética da descoberta do valor popular do colorido, do contraste, da mistura de elementos e aparente vulgarização de referências de todas as áreas, da política à religião, sem deixar de lado a arte clássica. Esse caldeirão de referências só é possível graças à observação de muitos fenômenos, traços, características e comportamentos. Junte esta postura de hiper-observação com o olhar crítico-metodológico e entenda melhor as pessoas!

Pesquisa baseada em Dados Sociais Digitais: mapeamento de ferramentas e táticas de coleta de dados no Intercom

Acaba de ser publicado meu artigo “Pesquisa baseada em Dados Sociais Digitais: mapeamento de ferramentas e táticas de coleta de dados no Intercom“, na revista digital iberoamericana Razón y Palabra. O objetivo do trabalho foi mapear padrões entre os artigos publicados no evento que realizaram coleta de dados interacionais, conversacionais e opinativos em sites de redes sociais. Variáveis relacionadas a quantidade de dados, ferramentas de coleta, plataformas analisadas e apresentação dos resultados foram rastreadas à luz de questões referentes aos desafios e potencialidades destas modalidades de pesquisa.

Total de Artigos x Artigos baseados em Coleta de Dados Sociais

O congresso da Intercom, Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, é o maior congresso de ciências da comunicação no Brasil. Além de conferências, traz grupos de trabalho, atividades de exposição competitiva de produtos laboratoriais, lançamento de livros e outros espaços de sociabilidade e colaboração entre pesquisadores do Brasil e outros países. A produção publicada neste evento serviu de indicador para refletir sobre as oportunidades, desafios e tendências que a oferta de dados nos sites de redes sociais trazem para os pesquisadores acadêmicos.

principais fontes de dados sociais digitais

Os GTs diretamente relacionados à mídias sociais neste congresso foram mapeados: Núcleo de Pesquisa em Tecnologias da Informação e da Comunicação [até 2008) e os grupos Cibercultura e Conteúdos Digitais e Convergências Tecnológicas a partir de 2009. A partir da filtragem de 704 artigos, cheguei a 72 que trabalharam diretamente dados interacionais, conversacionais e opinativos. As questões de pesquisa abaixo são respondidas e cruzadas com questionamentos sobre a redistribuição de métodos e especificidades da pesquisa digital.

a) Quantos trabalhos publicados no evento utilizaram coleta de dados sociais digitais?
b) Quais sites de redes sociais são abordados nos trabalhos do evento?
c) Quais as ferramentas utilizadas para coleta e processamento dos dados?
d) Quais os tipos de conteúdo e volume analisados nos artigos?
e) Como os pesquisadores abordam a relação entre conteúdo e indivíduos publicadores?
f) O conteúdo é apresentado de forma direta ou através de visualizações?
g) Os indivíduos observados, direta ou indiretamente, nos dados empíricos, são anonimizados?

De modo geral, os resultados parecem apontar para a necessidade de maior domínio e clareza de procedimentos metodológicos, exploração do potencial de tratamento do volume de dados e detalhamento de processos de codificação e análise que potencializem o aproveitamento das particularidades dos sites de redes sociais.

Leia o artigo em: Pesquisa baseada em Dados Sociais Digitais: mapeamento de ferramentas e táticas de coleta de dados no Intercom.

The Smarter Researcher – Ray Poynter lança mini-ebook com críticas ao big data

Ray Poynter, um dos principais advogados dos novos métodos de pesquisa no Reino Unido, principal ativador da excelente comunidade NewMR, lançou pequeno ebook chamado “The Smarter Researcher – how to survive in the changing market research landscape“. Entre as dicas para sobreviver no novo panorama da pesquisa de mercado, críticas relevantes ao big data. Clique para baixar:

big data isnt enough

Metáforas sobre Big Data

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Em interessante artigo, Sarah M Watson analisa as metáforas mais utilizadas ao se falar sobre “big data”. Diagnosticando a prevalência de metáforas industriais que falam dos dados como commodities, Watson advoga pelas metáforas que corporificam os dados, especialmente por percebermos que a maior parte da “big data” é social. Olhar os dados desta forma influencia na importante consciência de que os fenômenos tecnomercadológicos em torno de big data, no final das contas, envolve monetizar nossas ações e interações.

How we think about data—and more importantly what we do with it—will depend on the value systems that our conceptual metaphors capture and reify. Reframing metaphors for data in a more personal and embodied context will give us a better way to think of ourselves as information organisms, or “inforgs,” as philosopher Luciano Floridi suggests we are becoming. Our data profiles will act on our behalf, and we must be able to interact with and grasp their agency. Embodied data metaphors put more control in our hands as individuals, capable of interpreting and intervening in our own personal data management.

Leia o artigo na dis magazine.