Discurso no Twitter e Mídias Sociais: como usamos linguagem para criar afiliação na web

discourse and social media

O livro “Discourse of Twitter and Social Media: How We Use Language to Create Affiliation on the Web” foi lançado em 2012 pela professora Michelle Zappavigna, da University of South Wales (Austrália). A discussão e análise teórico-analítica se debruçou em um corpus, chamado de HERMES, criado pela pesquisadora com cerca de 7 milhões de tweets e de 100 milhões de palavras.

É um excelente exemplo da aplicação da linguística de corpus para a análise de mídias sociais, discurso, práticas interacionais, afetivas e políticas. Ao longo de seus capítulos, a autora aplica técnicas como análise de colocações, n-gram e contagem de frequências para identificar padrões e desvios nos textos do Twitter.

O primeiro capítulo, Social Media as Corpora, discute a possibilidade de entender as mídias sociais, e a sociedade através delas, a partir da construção de corpora de conteúdos textuais gerados em tempo real no Twitter. Parte do princípio de que as mídias sociais permitiram, sobretudo, a emergência da possibilidade de “discurso buscável” (searchable talk), com impactos relevantes na sociabilidade. Qualquer pessoa que já utilizou uma hashtag para marcar uma posição política ou para falar de um programa televiso, sabe muito bem do que a autora está falando:

“searchable talk, a change in social relations whereby we mark our discourse so that it can be found by others, in effect so that we can bond around particular values”

Zappavigna utiliza a SFL (systemic functional linguistics), que direciona a análise para uma abordagem funcional de análise utilizando metodologias de linguística de corpus. A partir da base antropológica, sobretudo de Malinowski, vê a linguagem como recurso para a realização de três funções: função ideacional de determinação de experiência, função interpesssoal de negociação de relações e função de textual de organização da informação.

Deste modo, no segundo capítulo, The Language of Microblogging, descreve as particularidades da linguagem no Twitter em suas manifestações fáticas, conversacionais ou como “backchannel” de outras atividades (vide segunda tela). Fatores da affordance do Twitter, como tamanho, hashtags e sua temporalidade própria são também analisadas. Neste capítulo a autora apresenta as primeiras aplicações de técnicas de linguística de corpus, como frequência de palavras:

hermes corpus - michele zappavigna

Evaluation in Microblogging, o terceiro capítulo, percorre o corpus HERMES a partir dos marcadores de sentimento/avaliação Julgamento, Afeto e Apreciação. Cada um dos “sistemas” de avaliação é explorado em detalhes, com inúmeros exemplos. Até o uso de emoticons é analisado de forma minuciosa, a partir da compreensão das emoções  expressas pelos usuários:

articulation network for facial emoticons

A criação de afiliação através dos textos é o tema do quarto capítulo, Ambient Affiliation. Através deste termo, a Michele Zappavigna procura mostrar como a plataforma é utilizada pelos seus usuários para gerar afiliações em torno de temas, tópicos e identidades. Aplicando o sociólogo Goffman, autor que melhor entendeu os processos micro-interacionais já na década de 1930 e hoje é aplicado em inúmeros estudos online, Zappavigna fala inclusive de como diversos estudos, inclusive o seu, mostram que técnicas de agrupamento (clustering) dão resultados consistentes apesar da aparente dispersão dos usuários. A liga social, neste caso, é a própria linguagem.

“we affiliate with a co-present, impermanente community by bonding around evolving topics of interest. This function is directly inscribed in the web interface to users’ Twitter accounts as the list of trending topics”

Nos três capítulos seguintes, Internet Memes, Internet Slang Internet Humour and fail: ‘The world is full of #fail tonight”, o livro analisa algumas particularidades das gírias, memes e humor no Twitter. Em sua maioria dos casos, são circulações meméticas que perpassam várias plataformas, como reddit e 4chan. Um trecho particularmente interessante é a análise da redefinição e complexificação do termo geek.

michele zappavigna collocates - geek out

Por fim, no nono capítulo, Political discourse online, a autora analisa um sub-corpus do Hermes chamado OWC – Obama Win Corpus. São 45290 publicados nas 24 horas subsequentes à vitória de Barack Obama nas eleições de 2008. O foco da análise se dá em torno da ideia de “mudança” (change), explorada pela campanha e militantes do político. É bem interessante também o relato que a autora faz dos tweets falando do cachorro presidencial, uma tradição no processo de construção da imagem dos presidentes americanos.michele zappavigna - collocates OWC - puppy

Por fim, nas conclusões a autora problematiza o futuro e limitações da linguística de corpus para as mídias sociais, especialmente relacionados à circulação de informação, inclusive textual, em formato de imagens.

+ Mais sobre Michele Zappavigna:

Twitter – https://twitter.com/smlinguist

Publicações – http://socialmedialinguist.blogspot.com.br/p/publications.html

Página na UNWS – https://sam.arts.unsw.edu.au/about-us/people/michele-zappavigna/

Google Scholar – https://scholar.google.com/citations?user=ILicbSEAAAAJ&hl=en

3 comentários sobre “Discurso no Twitter e Mídias Sociais: como usamos linguagem para criar afiliação na web

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