Monitoramento de Conversações sobre Políticos: prática, limites e possibilidades

[Artigo originalmente publicado no ebook Mídias Sociais e Eleições 2010]

A web como fonte de opiniões expressas espontaneamente é, hoje, já um lugar-comum. Durante os últimos quinze anos configurou-se uma convergência de diversos fatores sociais, políticos, tecnológicos e econômicos que possui como subprodutos novas práticas da pesquisa de marketing.

Uma delas é o que chamamos de Monitoramento de Marcas e Conversações, comumente chamado também de Monitoramento de Mídias Sociais, Buzz Monitoring e outros termos. Retomando uma definição utilizada em outro artigo, o Monitoramento de Marcas e Conversações pode ser definido como “a coleta, armazenamento, classificação, categorização, adição de informações e análise de menções online públicas a determinado(s) termo(s) previamente definido(s) e seus emissores, com os objetivos de: (a) identificar e analisar reações, sentimentos e desejos relativos a produtos, entidades e campanhas; (b) conhecer melhor os públicos pertinentes; e (c) realizar ações reativas e pró-ativas para alcançar os objetivos da organização ou pessoa de forma ética e sustentável.”[1]

Através deste ebook, pode-se entender como as pessoas utilizaram as mídias sociais em maior ou menor grau para expor suas opiniões, realizar protestos e tentar influenciar umas às outras. O monitoramento de marcas e conversações é o processo pelo qual o comunicador pode diagnosticas diversos fatores para planejar suas ações, identificar oportunidades e prever ameaças. No caso do monitoramento voltado ao processo das eleições, algumas particularidades podem ser apontadas. Em outro artigo também disponível online[2], já apresentamos algumas reflexões sobre o monitoramento voltado às eleições. O que se observou na última eleição foram iniciativas múltiplas de utilização destes softwares e técnicas, por parte de políticos, equipes de comunicação e agências de políticos, jornalistas, militantes e eleitores comuns.

O objetivo deste presente artigo é fornecer, associado aos dois artigos supracitados, uma base para o profissional de comunicação política entender as possibilidades do monitoramento de marcas e conversações para seu setor.

Monitorando políticos

Uma primeira particularidade de se monitorar políticos é que são pessoas. Os termos-chave, assim como no caso de celebridades da música e cinema, por exemplo, são nomes comuns. Dois entraves se apresentam de imediato: um entrave econômico e outro operacional. O primeiro entrave econômico é que, ao utilizar um software de monitoramento pleno, os custos estão baseados na quantidade de buscas e/ou menções. Se uma busca a um hipotético político chamado “João Silva” resultar em milhares de menções que não se referem ao político em questão.

O segundo entrave, mais grave, é o entrave operacional. A depender do software utilizado e das especificações possíveis na busca, boa parte do tempo dos analistas pode acabar por ser perdido apenas limpando as menções indesejadas.

Aqui estamos falando de pessoas geralmente. Valores e temas relativos a afetos e opiniões levarão em conta realmente a “personalidade” da marca que, neste caso, não é apenas uma metáfora para o relacionamento multidirecional online. Boa parte dos cidadãos vêem e pensam os políticos a partir do que pressupõem que são suas intenções.

Com um sistema político ainda extremamente individualizador, o monitoramento de menções  a partidos brasileiros é muito interessante, porque mostra o substrato da heterogeneidade que compõe os partidos.

Outra vez é preciso lembrar que os usuários de internet, e principalmente os produtores de conteúdo online, representam apenas uma parcela ínfima de população nacional. Não se deve ainda pressupor representatividade dos dados coletados online em relação à população total de eleitores do país ou de uma região.

Ainda assim, o monitoramento de marcas e conversações é um tipo de pesquisa de marketing altamente valoroso, especialmente pras iniciativas de comunicação digital.

Principais Aplicações

1. Proximidade a Termos-Chave. A absurda popularidade do presidente Lula trouxe algumas particularidades nestas eleições, especialmente nos estados em que a base de apoio à Dilma estava dividida. Alguns adversários em certos embates estaduais concordavam em um ponto: apoiar Lula e, mais que isso, mostrar que apoiavam Lula. Em muitos casos foi uma briga pra mostrar quem era mais amigo do presidente. Mesmo políticos como Serra, em certo momento, decidiram mostrar que não eram “adversários” do atual presidente, mas sim políticos que continuariam esta boa gestão.

Informação e desinformação, baseada em declarações reais ou falsas, atuais ou passadas, foram utilizadas por diversos candidatos para mostrar que apoiavam Lula e que os adversários nem tanto. Um dos recursos do monitoramento que serviu para analisar isto, por exemplo, foi o que permitiu analisar proximidade das marcas em questão (políticos e seus adversários) à toda poderosa marca “Lula” e, em alguns casos, “Dilma”. A mídia espontânea, assim como a mídia jornalística online pode, então, ser analisada em termos de percepções dessa proximidade.

2. Análise de Sentimento. De longe, o tipo de análise de monitoramento mais utilizado foi a de análise de sentimento. Este recurso consiste em contar o número absoluto de menções positivas, negativas, neutras e mistas às palavras-chaves: nomes dos candidatos, partidos e adversários.

Durante os meses imediatamente anteriores às eleições e durante estas, diversas iniciativas surgiram de programas de monitoramento e análise de sentimento que prometiam realizar análise automática de conteúdo. Quase sempre tweets. A maioria dessas iniciativas pecava em três fatores básicos: 1) focava a coleta apenas em uma única mídia social; 2) fazia análise automática de sentimento, que é imprecisa; 3) davam ênfase total a este aspecto, subestimando o valor de análises mais aprofundadas.

Porém, a análise longitudinal da variação do sentimento permite associar eventos online (publicações, conteúdo) e semi-exógenos (declarações na televisão, debates, cobertura jornalística, comícios) à expressão dos eleitores conectados. O que faz com que os ânimos se animem na web?

3. Temas Comuns e Influentes. As opiniões expressas no ambiente online são mais espontâneas do que as opiniões ofertadas a um pesquisador de prancheta. E os interesses de parcelas da população podem ser identificados através de web analytics, tendências de buscas, produção de conteúdo. As formas de apropriação desse conteúdo, ainda, podem ser percebidas através de comentários e recomendações.

Dentro das opções de posicionamento de um político, para quais ele está mais preparado? E para quais pode melhor se preparar? Alguma temática nociva está associada ao político? É possível analisar tudo isto no ambiente web através de declarações espontâneas. Este pode ser inclusive um dos principais indicadores de performance da comunicação online.

 4. Relacionamento com o Eleitor. Um dos principais recursos do Monitoramento de Marcas e Conversações é o fator imediato do monitoramento em si. Menções a candidatos, quer citando as URLs e @’s dos perfis ou não, são coletadas em tempo real. Uma equipe rápida de comunicação, que esteja preparada o suficiente, pode responder a críticas, esclarecer mal-entendidos, desmentir boatos e agradecer o apoio de cidadãos assim que estes expressam suas opiniões.

Evidentemente, é preciso definir linhas de ação e respostas integradas. Algumas plataformas de monitoramento possuem recursos de CRM e a tendência é que todas as grandes do mercado incorporem estes recursos.

5. Planejamento da Comunicação. O Monitoramento de Marcas e Conversações não deve ser utilizado para coletas menções apenas ao nome dos candidatos e concorrentes. Ao coletar menções a assuntos que estão positivamente ou negativamente associados aos políticos e/ou com potencial de disseminação positiva ou negativa, os comunicadores podem identificar os melhores modos de se abordar determinados assuntos e mesmo perceber se estes devem ser abordados.

Por exemplo, a coleta de menções a termo-chave do posicionamento de algum político serve para a definição e otimização da linha editorial e até discursos na comunicação do candidato. Por exemplo, monitorar o que as pessoas falam sobre “pedofilia” permite à equipe de candidato engajado na luta contra este problema: identifique quais notícias sobre o tema ganharam mais repercussão nos últimos meses; prepare conteúdo atualizando o candidato sobre eventuais debates e anseios populares em torno do problema; evite temáticas consideradas sensíveis demais pela moral média; etc.

6. Previsão de Resultados. Talvez a aplicação mais polêmica do monitoramento de conversações. Algumas iniciativas[3] de monitoramento de dados na web tem avaliado a previsibilidade de ações (como votos) a partir da análise do que as pessoas falam sobre determinados temas.

A identificação de padrões em todas atividades humanas tem chamado a atenção também de pesquisadores consagrados das redes sociais, como Albert László-Barabási[4]. A cobertura de diversas iniciativas públicas de monitoramento como o Observatório da Web[5] e o experimento da JWT[6] tentaram observar correlações entre o volume de citações e as intenções de voto.

Ainda muito longe de serem precisas (e talvez nunca o serão), a previsão de ações através da coleta de dados relativos a comportamentos é uma tendência e promete movimentar o mercado da comunicação política em 2012, para o bem e para o mal.

Recepção do Mercado

Outra vez é preciso chamar atenção para a necessidade de se buscar um mercado ético e sustentável. Diversos projetos nas últimas eleições foram lançados para atingir os partidos, políticos e equipes em polvorosa com as eleições, buscando resultados, mas sem tempo de avaliar corretamente as ofertas de serviços.

Cada empresa, agência, profissional, consultor ou analista deve agir de forma responsável para em busca de um mercado que seja justo e seguro para todos os envolvidos, do político ao publicitário e o eleitor como prioridade. Apenas assim o cliente médio do setor político que, com o passar dos anos, estará cada vez mais digital, vai realizar seu trabalho eleitoral e, principalmente o político, pensando, entendendo e aproveitando as possibilidades da inteligência coletiva.


[1] SILVA, Tarcízio. Monitoramento de Marcas e Conversações: alguns pontos para discussão. In: DOURADO, Danila; SILVA, Tarcízio; CERQUEIRA, Renata; AYRES, Marcel (orgs.). #MidiasSociais: Perspectivas, Tendências e Reflexões. E-book. Disponível em: http://www.issuu.com/papercliq/docs/ebookmidiassociais

[2] SILVA, Tarcízio; SANTOS, Nina. Monitoramento Online e Vigilância nas Eleições 2010. In: IV Simpósio da Associação Brasileira dos Pesquisadores em Cibercultura, 2010, Rio de Janeiro. Anais do IV Simpósio da Associação Brasileira dos Pesquisadores em Cibercultura, 2010.

[3] Ver http://www.psfk.com/future-of-real-time

[4] Ver vídeo do autor sobre sua pesquisa em http://www.youtube.com/watch?v=7YFNf1ix_yY

[5] http://www.observatorio.inweb.org.br/eleicoes2010/destaques/

[6] http://www.adnews.com.br/internet/109107.html

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