Desk Research é um termo, em pesquisa de mercado tradicional, que era bastante auto-explicativo em décadas anteriores. A “pesquisa de mesa” era feita por pesquisadores antes de colocar equipes na rua ou nos telefones para falar com respondentes, no caso de pesquisas quantitativas, ou de selecionar participantes e agendas grupos focais no caso de pesquisas qualitativas. Geralmente foi traduzida por “pesquisa secundária” pois se refere ao levantamento de dados, informações e estudos já publicados ou referentes ao contratante e seu segmento.
Em grande parte do mercado de monitoramento de mídias sociais, entretanto, o termo é quase desconhecido. Isto é resultante tanto da origem muitas vezes dissociada do mundo da pesquisa de mercado quanto da pouca preocupação metodológica nos estudos. Usei o termo em inglês para o título deste texto justamente pelo curioso fato de que o analista de monitoramento de mídias sociais já faz o núcleo do seu trabalho, ironicamente, sentadinho em uma mesa. Então segue uma lista de táticas de desk research que casam bem com as práticas de monitoramento de mídias sociais:
Pesquisas e Relatórios já comprados/realizados pela empresa. Quais as expectativas de seu cliente? A discrepância entre expectativa e entrega é um dos grandes entraves no relacionamento entre empresa e pesquisadores. Ao solicitar e avaliar os relatórios e produtos de informação já recebidos, o benefício de diminuir esta discrepância já é um primeiro valor a ser retirado desta estratégia.
Porém, mais do que isso, em empresas de porte mais avançado, o cruzamento de dados e análises provenientes de diversas modalidades de coleta de dados e pesquisas (surveys, grupos focais, pesquisa de mídia etc) permite gerar ainda mais informação. Cada fornecedor não deve estar isolado em seus silos, mas aproveitar o que os outros olhares sobre a inteligência da empresa podem trazer. Assim, a primeira tarefa de desk research durante a fase de planejamento e implementação de projetos de monitoramento de mídias sociais é levantar quais outros produtos de informação o cliente possui ou já possuiu.
Associações Setoriais – praticamente qualquer setor industrial, de comércio ou serviços possui associações e similares em defesa de seus mercados. FIESP, FIEMG, Abrabe (bebidas), Abrati (transporte), Abrasce (shoppings), Sindiomas (escolas de idiomas), Abimci (madeira processada), Alshop (lojistas de shoppings) são alguns exemplos de associações setoriais que procuram organizar conhecimentos sobre seus mercados. Boa parte de associações como estas publicam de forma aberta pesquisas e levantamentos que podem servir de referências de dados ou conceitos para o analista de monitoramento na melhoria de suas análises e conclusões.
A tela ao lado, de pesquisa da ANTP, por exemplo, compara a avaliação do serviço de transporte público na área metropolitana de São Paulo. São dados de interesses para estudos e pesquisas de monitoramento de mídias sociais direcionados a linhas de ônibus, empresas de táxi, gestão municipal etc.
Dados de Institutos de Pesquisa sobre Internet. Alguns institutos de pesquisa ou outras iniciativas como CGI.br, Comscore Ibope e outros são importantes fontes sobre o comportamento dos indivíduos online. Dados sobre plataformas preferidas, intensidade de uso, distribuição geográfica e motivações de uso são levantadas por organizações como estas e podem ser utilizadas como dados contextualizadores.
Relatórios de Monitoramento para Divulgação. Um mapeamento realizado por Nathan Gilliatt lista mais de 720 ferramentas de social analytics. Estas empresas, assim como agências, consultorias e até profissionais, frequentemente publicam relatórios sobre de benchmarking ou sobre determinados acontecimentos e segmentos de mercado, com o intuito de divulgar suas funcionalidades e serviços. Tais relatórios e documentos podem ser mapeados pelo analista, que assim entenderá diversos olhares e interpretações possíveis sobre dados da área de interesse do seu contratante.
Pesquisa Acadêmica. Aqui está uma das pérolas mais úteis, porém muito ignoradas. Anualmente, dezenas de milhares de pesquisadores recebem títulos de mestrado ou doutorado no Brasil, em número crescente. Todos eles publicam teses e dissertações com os resultados de suas pesquisas. Boa parte deles são de áreas que podem envolver direta ou indiretamente comportamento social, como Comunicação, Ciência Política, Linguística, Computação Social e Psicologia. As descobertas, sistematizações, conceitos e teorias de algum estudioso acadêmico poderão servir a seu projeto de pesquisa e monitoramento de mídias sociais.
Buscadores especializados como Google Acadêmico e Periódicos Capes permitem encontrar não só teses e dissertações, mas também as numerosas revistas acadêmicas. O Brasil é especialmente reconhecido, quando comparado às potências em produção científica, como um país com alta taxa de compartilhamento de dados científicos. Em outra postagem indiquei lista de blogs acadêmicos que poderá ser útil como primeiro contato.
Observe, por exemplo, alguns trabalhos publicados no Intercom 2014. Há trabalhos sobre haters políticos e ódio no facebook, literatura digital, e-commerce, cinema, blogs de moda e outros. Tais artigos, baseadas em diferentes referenciais teóricos, podem ser utilizadas como ponto de partida para a criação de categorias de análise para segmentos relacionados. Algums exemplos: os tipos de comentários mapeados em artigo sobre o Filmow podem ser ponto de partida para categorias e tags usadas em relatórios que trarão como output um guia de respostas a uma distribuidora de cinema como a Paris Filmes; o artigo que tratas percepções sobre o Guaraná Jesus e territorialidade é um bom documento de apoio na análise do branding desde a compra pela Coca Cola; e as quantificações realizadas em trabalho sobre haters políticos podem ser marco comparativo em monitoramentos políticos para os partidos estudados.
Documentários – entre o informacional e o artístico, documentários são um modo divertido de imergir ainda mais no universo temático da pesquisa. Trazem a vantagem de serem, via de regra, trabalhos autorais que muitas vezes irão de encontro às narrativas e interpretações de associações setoriais. Por exemplo, o documentário Into Eternity destrincha a construção do Onkalo, o primeiro depósito “permanente” de lixo nuclear. Ao longo das entrevistas em seus 75 minutos, toca em questões sociais e filosóficas em torno da iniciativa. Para estudos envolvendo a questão energética, é uma grande fonte de inspiração.
Assim como temas distantes da realidade cotidiana como o armazenamento de lixo nuclear, outros ambientes sociais estranhos ao pesquisador podem ser melhor entendidos através de documentários. No caso acima, as entrevistas realizadas por Eduardo Coutinho em Últimas Conversas, editado e lançado postumamente, permite aos interessados compreender melhor as aflições, sonhos, visões de mundo e comportamento de adolescentes.
Pingback: CoLab Social Media: comportamento do consumidor, planejamento e estratégia (1/6) – insightee