[O texto a seguir faz parte de uma série que pode ser visualizada em “Pontos, Linhas e Métricas: introdução à análise estrutural de redes sociais”]
Voltando às postagens da série Pontos, Linhas e Métricas, vou sugerir o primeiro exercício de exploração de redes a partir dos seus próprios dados. Antes de chegarmos aos softwares mais complexos, como NodeXL e Gephi, vou apresentar diversos softwares online de visualização de redes para que vocês possam se habituar a observar os formatos, agrupamentos e relações entre os nós.
Immersion
O projeto Immersion é uma iniciativa do estudante de mestrado no MIT Media Lab Daniel Smilkov (@dsmilkov2) do MIT Media Lab, do pesquisador do grupo Macro Connections do MIT Media Lab Deepak Jagdish (@dj247) e do líder do grupo César Hidalgo (@cesifoti). No site do Macro Connections é possível saber mais e acessar outros projetos do grupo.
Em resumo, o Immersion acessa o histórico do seu Gmail pra coletar os dados de “De”, “Para”, “Cc” e a data de cada email. Assim, a visualização transforma cada email enviado e recebido em uma aresta, onde cada nó representa uma pessoa. As datas permitem a visualização temporal das redes. Ou seja, aqui trata-se de uma rede social ego (centrada no indivíduo) e que pode trazer informações sobre padrões e intensidade da comunicação, via email, do usuário e seus contatos. Um dos principais recursos é a clusterização dos nós (agrupamento dos nós de acordo com suas conexões). Como é explicado no próprio site, trata-se de auto-reflexão, arte, privacidade e estratégia:
“So Immersion is not about one thing. It’s about four. It’s about self-reflection, art, privacy and strategy. It’s about providing users with a number of different perspectives by leveraging on the fact that the web, and emails, are now an important part of our past”.
O vídeo abaixo mostra os bastidores do projeto:
Immersion: Beneath the surface from Deepak Jagdish on Vimeo.
Exemplo de Análise
O Immersion, assim como centenas de outros projetos do tipo, é um exemplo do que eu chamo, na minha dissertação, de aplicativos de análise de informações sociais digitais. Hoje, aplicativos como Klout, PeerIndex, TweetStats, You Are What You Like e muitos outros são também utilizados pelas pessoas comuns para entender melhor a si e ao seu contexto social. Afinal de contas, se eu falo muito com uma pessoa através de emails, isto significa a princípio que tenho algum tipo de relação.
Rede 01 – Esta rede corresponde a fase final de meu período de graduação. Observe como os clusters (agrupamentos) são bem próximos, possuem muitas arestas em comum. Os dados estão anonimizados para exibir aqui, mas os maiores nós (o vermelho e o verde na rede abaixo) representam pra mim dois relacionamentos, respectivamente pessoal e profissional, que definem aquele período:
Rede 02 – Esta segunda rede representa a fase de idealização e construção de uma agência. Observem como é ainda mais densa. Os dois maiores nós representam parceiros profissionais e a discrepância em relação aos outros nós são indicadores da prioridade dada, no período, ao projeto:
Rede 03 – Esta fase representa o período de saída da agência e escrita da dissertação. As comunidades de contatos são mais dispersas entre si e bem definidas, pois se multiplicaram. Devido à relativa reclusa e trabalho focado, individual (dissertação), o maior nó é de um relacionamento amoroso. A comunidade azul escura são outros amigos que faziam parte deste círculo social. A comunidade verde tem como maior nó o orientador de mestrado e é composta de outros pesquisadores da pós-graduação.
Os nós vermelhos são de um projeto profissional realizado basicamente através do email. Os nós possuem quase o mesmo tamanho pois foi uma longa discussão através e uma lista de e-mails para a produção de um ebook. Os nós laranjas são os mesmos parceiros profissionais da fase anterior: aqui são menores, numa fase de transição. Os nós marrons representam contatos tanto profissionais quanto pessoais de São Paulo, pois foi uma fase de preparação para a mudança. Os algoritmos de visualização acabam por perceber esta diferença de locais: os clusters acima da metade da figura são de São Paulo, enquanto os de baixo são de Salvador:
Rede 04 – Esta rede representa os primeiros meses em São Paulo. A importância das relações presenciais para os contatos online se confirma: apenas o cluster vermelho e os pequenos nós do cluster marrom (com exceção do maior, também uma ponte) são de Salvador. Os outros clusters são de São Paulo e outras cidades: representam projetos profissionais, grupos de alunos etc. O grupo verde representa novamente a descrição de um ebook. Observe como um dos nós rosa está perto do cluster verde: é um contato profissional que foi responsável por que eu conhecesse o cluster rosa (uma indicação de trabalho). Ou seja, é possível também visualizar a importância estratégica das pessoas enquanto “pontes” sociais.
Rede 05 – por fim, esta rede representa os últimos meses, onde outro redirecionamento pessoal e profissional foi realizado. Os clusters representam pequenos projetos pontuais e grupos de amigos. A grande quantidade de nós isolados é resultado das trocas de e-mails para uma pesquisa em andamento.
Observando os dados de redes sociais extraídos e processados a partir do meu email, realizei uma ação de auto-reflexão sobre meu passado recente. É um tema cada vez mais importante na atualidade, uma vez que mais e mais rastros e traços digitais são armazenados no nosso cotidiano. Em artigo com o José Carlos Ribeiro (RIBEIRO e SILVA, 2012), propusemos o seguinte diagrama para mostrar a dinâmica envolvida em dois tipos de dinâmicas: visualização comparativa e visualização temporal abrangente.
No caso do Immersion, tratamos da segunda: a coleta e apresentação dos dados traz dados e informações sobre padrões de interação que não seriam possíveis de serem analisadas por uma pessoa comum em outros contextos. Além disso, o tipo de visualização estrutural das redes é um tpo de recurso cognitivo também próprio da contemporaneidade: vinte anos atrás seria praticamente impossível a uma pessoa comum visualizar-se deste modo.
Exercício
Provavelmente a descrição de minhas redes ficou vaga, devido ao caráter anônimo e os poucos detalhes resultantes disto. Então, o melhor a ser feito é você explorar sua própria rede. O software, como vimos acima, permite realizar esta análise histórica sobre os seus próprios dados.
Então, para experimentar melhor as possibilidades, consolidar aprendizados e extrair insight, recomendo que abra sua própria rede e se pergunte o seguinte:
- Quais são os grupos que você consegue identificar? A ferramenta dividiu bem seus ambientes sociais (trabalhos, cidades, grupos de amigos, escolas, universidades etc)?
- Quais são as díades mais intensas? Por quê?
- Que tríades representam algo significativo pra você?
- Compare o ano inteiro de 2011 e o ano inteiro de 2012. Quais as diferenças? Quais pessoas estão mais presentes nas trocas de e-mails? Quais sumiram de um ano para o outro? Por quê?
- Tente dividir o período coletado em fases, como eu fiz. As diferenças nas redes dizem o quê a você?
Em breve, publicações sobre sociometria e exploração de suas próprias rede no Facebook.
Referências
RIBEIRO, José Carlos; SILVA, Tarcízio. Self, Self-Presentation, and the Use of Social Applications in Digital Environments. In: LUPPICINI, Rocci. Handbook of Research on Technoself: Identity in a Technological Society. Idea Group,U.S., 2012.
Este tipo de análise pode ser feita come-mails corporativos? Caso a TI se alinhe com a gente neste processo?
É sim, Clarissa! É uma metodologia comum para análise de organizações. É possível identificar, por exemplo, fluxos de inovação, hubs de funcionários que são vistos como referências e mais consultados, comparar fluxos formais e informais de comunicação e assim por diante. Um exemplo: http://www.orgnet.com/email.html
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