Dia 22 de fevereiro estréia nos cinemas brasileiros o longa de animação Persépolis (Persépolis, França, 2007). Baseado na história em quadrinhos autobiográfica de mesmo nome, escrita e desenhada pela franco-iraniana Marjane Satrapi, a obra foi dirigida pela autora em parceria com Vincent Paronnaud.
A produção aporta quase um ano depois do seu lançamento original, mas já é bastante comentada em algumas rodas de cinéfilos. Isso se deve ao reconhecimento obtido no Cannes do ano passado, quando obra foi selecionada pelo júri, juntamente com outro filme, filme Luz Silenciosa, e à exibição na Mostra SP de outubro do ano passado. Obviamente, ele era discutido também pelos leitores da história em quadrinhos, que infelizmente vendeu pouco.O enredo gira em torno das aventuras de Marjane, ou Marji, na Irã sob os ditames da república islâmica dos anos 80 e 90. Descendente de duas gerações de militantes comunistas, ela leva a rebeldia e a garra para todos os campos de sua vida, do âmbito político ao sexual. Confusa entre o que acredita e o que vê, Marjane é uma garota que luta para ser forte em meio a um país que é um extramente repressor. No decorrer da adolescência, a garota se muda para a Áustria e descobre-se atraída pela cultura ocidental como nunca acontecera, mas mesmo assim tenta se apegar às tradições iranianas, o que a faz se sentir sem identidade.
Os maiores destaques do enredo narrado em primeira pessoa são as buscas de Satrapi por liberdade e o panorama político iraniano traçado. Mesmo a história se desenrolando na década de 80, flashbackes remontam ao passado, para desembocar no presente de violência e repressão. Enquanto vive na Áustria, ela tenta ser uma jovem comum, mas sua descendência dificulta o processo de integração pelos amigos ocidentais.
A animação tem arte variada. Quase sempre ela segue o clássico padrão 2D como nos antigos filmes da Disney. No entanto, em alguns pontos a animação digital aparece para compor cenários e linhas narrativas diferentes. Aliás, o filme tem diferentes momentos e climas, em transições naturais e rápidas. Essa característica é uma faca de dois gumes: o ritmo meio alucinado da animação difere do compasso demarcado visto mo quadrinho, e dá uma impressão de superficialidade à história – ao contrário da graphic novel, que desenvolve muito bem cada fase da personagem. Em compensação, o mosaico de narrativas e cenas vêm recheadas de fascinantes e lindas imagens.
A trilha sonora do filme é bem escolhida, salvo a execução de “Eye of the tiger”, numa cena muito forçada e desnecessária, que não estava presente no livro. Destaque para a música de abertura, tema da película.
Persépolis é um filme bom, que tem potencial para levar o Oscar de Melhor Animação. No entanto, a verdadeira essência da obra está encarnada na mídia em que foi originalmente lançada: os quadrinhos. Ali vemos, com uma emoção vibrante, cada passo dado pela autora até seu amadurecimento e saída do Irã. Em muitas passagens, ela demonstra a importância de viver, de lutar e de conhecer a si mesmo. Muita dessa força foi perdida na adaptação das telonas, que corre para em pouco mais de 80 minutos de filme narrar um livro de 327 páginas – pelo menos na edição definitiva da Editora Cia. Das Letras.
A arte econômica de Satrapi é bastante envolvente e nos conduz a um mundo fantasioso e instável, porém cheio de recompensas belas e feiúras marcantes. Mesmo sendo minimalista, muitas vezes a autora adota certo exagero para demonstrar os loucos desejos que existiam em si mesma ou então a sua desgraça que vinha em doses homeopáticas. É impossível não sentir o que está acontecendo com a autora, mesmo se tratando tão-somente da leitura de quadros e mais quadros.
Se você se interessar pelo filme, recomendo a história em quadrinhos. Ela me fez chorar três vezes, o filme não.
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